terça-feira, 27 de outubro de 2009

Dentistas do bem já atenderam 150 adolescentes carentes em Macapá

Daiz Nunes, cirurgiã dentista, integra a ONG Turma do Bem e coordena no Amapá, juntamente com sua colega Adriana Gato, o projeto Dentista do Bem. A ONG está presente hoje em toda a América Latina e é a maior organização voluntária do mundo, segundo Daiz, e já atendeu 12 mil crianças e adolescentes entre 11 e 18 anos. A jovem profissional fala entusiasmada do trabalho feito em Macapá desde 2007 por 80 profissionais Odontólogos junto às crianças da rede pública de ensino. O resultado foi parar na tela da Rede Globo com a história da menina Jéssica Ferreira, que exibiu lindo e novo sorriso, conquistado no tratamento, além de dançar a música Tarumã, de Osmar Júnior, no programa Caldeirão do Huck. Daiz conta essa experiência.

Café com Notícia – Como você conheceu o projeto Dentista do Bem?

Daiz Nunes – No ano de 2006, em um congresso, essa organização tinha um estande e estava mobilizando dentistas para que participassem do projeto. Quando entrei no estande mostraram um documentário realizado em Campinas – SP com um menino que tinha sérios problemas de saúde bucal. Ele não sorria, mal falava e tinha medo de comer porque não queria quebrar o resto dos dentes. No posto de saúde ouviu do dentista que precisava fazer canal, mas lá não havia material pra fazer. A única opção era extrair todos os dentes. Mas, com 15 anos, ele não queria perder os dentes. Era xingado no colégio.

Café com Notícia – Essa é a realizada na odontologia no serviço público no Brasil?

Daiz Nunes – Foi aí que eu percebi que a nossa importância é muito maior do que a gente imagina. Então entrei no projeto porque aqui não é diferente. Já fui funcionária do município e sei que no serviço público não somos dentistas, somos mutiladores. Nós fazemos lesão corporal grave, porque quando você arranca um dente tem que imediatamente reabilitar. É a mesma coisa que um médico faz quando amputa um membro, encaminha para que seja providenciada uma prótese. A gente não, a gente simplesmente elimina. A gente não cura, não previne e nem trata.

Café com Notícia – A odontologia não é vista como prioridade na saúde pública?

Daiz Nunes – E é isso que precisa acabar. A odontologia evoluiu muito e nós ficamos para trás no serviço público. Não participamos das equipes de saúde como deveríamos. Precisaríamos estar inseridos nos hospitais, porque os pacientes internados precisam de dentista para higienizá-los, para tratar das doenças decorrentes das enfermidades sistêmicas que eles apresentam. No Norte nossa dificuldade é muito grande, até para que orçamentos sejam mobilizados para cá. O Sul e o Sudeste têm muito mais atenção, muito mais mobilização.

Café com Notícia – Como a ONG Turma Bem chegou ao Amapá para realizar o documentário com as crianças da escola Castro Alves?

Daiz Nunes – Foi quando conheci o Fábio Bibancos, presidente da ONG Turma do Bem, que pude compartilhar minhas angústias. Ele decidiu fazer o segundo documentário em Macapá, Boca da Mata, lançado em 2007. E aí eu descobri que podia conseguir mobilizar as coisas. Conseguimos empresários que doaram as passagens da equipe de produção, estadia em hotel.
O projeto tem um coordenador em cada estado, que vai às escolas públicas fazer a triagem das crianças. A gente detecta as mais doentes e mais carentes. Depois nós conseguimos o dentista que integra o grupo e que vai adotá-la (tratá-la) até os 18 anos de idade. Porque nessa fase o poder público não tem projeto para tratá-las. O que tem são ações de aplicação de flúor, escovação de dentes. Mas, como se pode tratar com flúor uma criança que tem cárie? Flúor é para quem não tem cárie. Escovar os dentes resolve para quem não tem nenhuma doença.

Café com Notícia – Então, essa aplicação de flúor em massa que se faz em escolas e nas comunidades não tem eficácia?

Daiz Nunes – Nada! Você aplica flúor para prevenir a cárie. Não adianta aplicar numa criança que tem gengivite e uma cárie enorme na boca. É preciso antes tratá-la e depois acompanhá-la com flúor, que só é efetivo até os 12 anos. A partir dessa idade o adolescente tem outros tipos de doenças além de cárie. Tem problemas na gengiva que é trazido por outro tipo de bactéria, por deficiência na higiene, por causa da alimentação. As crianças de 1ª a 4ª série também não têm tratamento.

Daiz Nunes
– Por que o projeto definiu como público alvo a faixa etária de 11 a 18 anos?

Café com Notícia – Nossa angústia maior era com os adolescentes que iam para o primeiro emprego, que queriam arranjar namorado e namorada, beijar na boca. E a aparência é determinante. Não ter auto-estima é definitivo pra eles.

Café com Notícia – Quantos dentistas do Amapá integram o projeto?

Daiz Nunes – Temos 80 dentistas e já atendemos em média 150 crianças desde 2007. Mas, enfrentamos muitas dificuldades. Muitas desistem do tratamento, somem e quem falta, infelizmente é cortado do projeto. Algumas abandonam porque não têm sequer o dinheiro do ônibus. Os pais assinam o termo de autorização, mas depois não conseguem acompanhar. Às vezes nós mesmos pagamos o ônibus. Tem meninas que param de vir porque engravidam novas.

Café com Notícia – Quantos adolescentes cada dentista atende pelo projeto?

Daiz Nunes – Cada um pode escolher quantos vai atender. Eu atendo 20. Nós fazemos uma premiação anual em São Paulo. Tem dentista que atende 50 crianças. Os custos do tratamento são assumidos por nós. A ONG tem patrocínio pra manter outros compromissos como um escritório, de onde saem as ligações para os pais, para os dentistas, uma folha de pagamento.

Café com Notícia – No próximo dia 26 a Turma do Bem estará lançando um terceiro documentário?

Daiz Nunes – Esse que vamos lançar dia 26 no Teatro das Bacabeiras é um documentário de 50 minutos, que abrange 30 estados.

Café com Notícia – Como as Crianças e adolescentes que precisam de tratamento dentário devem proceder para chegar até os dentistas do bem?

Daiz Nunes – Nós continuamos indo às escolas. Temos metas anuais, somos muito organizados e atuamos nas escolas da periferia e nas instituições filantrópicas, se elas não tiverem envolvimento político. Às vezes os pais ligam e indicam a escola. Nossos critérios são rigorosos, porque às vezes a criança está com várias cáries na boca, mas a família tem carro, empregada doméstica e aí não dá para atender. Nesse caso são os pais que estão excluindo a criança da saúde.


Café com Notícia – A menina Jéssica Ferreira, que apareceu em rede nacional dançando no programa Caldeirão do Huck da Rede Globo, é sua paciente. Como foi a experiência de ver esse trabalho reconhecido nacionalmente?

Daiz Nunes – A gente quer essa visibilidade para que todo mundo entenda que a odontologia ainda não está no lugar certo. A Jéssica participou do documentário Boca da Mata. O Luciano Huck fazia o quadro Lar doce Lar e percebeu que todos da família estavam com problema na boca. Então, ele procurou o Fábio Bibancos, presidente da ONG., que pegou os documentários de Campinas e de Macapá e mostrou para o Luciano. E a Jéssica é uma criança, que mesmo quando doente, era muito animada. Ele a viu dançando e quis levá-la, junto com o adolescente de Campinas para o programa. A produção queria que ela dançasse alguma música e foi aí que a gente quis mostrar o que é da nossa terra, e ela dançou Tarumã. Hoje ela faz acompanhamento odontológico e de outros problemas de saúde com médicos também voluntários e nós conseguimos uma bolsa de balé no Estúdio Rose. A Jéssica é uma artista nata, é linda e fez o show que fez no Luciano Huck.
(Na foto as odontólogas Daiz Nunes e Adriana Gato, coordenadoras do projeto Dentista do Bem no Amapá)

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